segunda-feira, 20 de julho de 2009

“Empresários devem pressionar mais por acordo climático”

Como primeiro post oficial dest blog, peguei a etrevista que fiz com o inglês Simon Zadek, fundador da AccountAbility - empresa que busca levar a sustentabilidade para dentro das corporações. O material foi originalmente publicado no Mercado Ético e logo foi replicado em diversos sites do país.

Quando foi entrevistado pelo Mercado Ético em junho, Simon Zadek, fundador da AccountAbility e membro do Conselho Consultivo Internacional do Instituto Ethos, não estava lá muito otimista. O fracasso nas negociações climáticas em Bonn, na Alemanha, segundo ele, mostrou que o mundo está longe de chegar a um acordo que impeça o superaquecimento do planeta. O lobby das companhias que lucram alto com a emissão de carbono e desmatamento continua muito forte.

Para Zadek, o momento é de contrabalançar essa força. “A comunidade empresarial brasileira deve pressionar os políticos para um forte acordo climático”, defende. “Se não conseguirmos isso, o resto se tornará irrelevante, pois não estaremos muito tempo por aí para contar a história”, alerta.

Mas ele diz que os empresários sozinhos não farão diferença nenhuma. Assim como não fariam as ações isoladas de bancos, políticos e consumidores. “A única forma de mudança é unir toda a ação do indivíduo em um contexto de coletividade”, defende.

Leia a seguir a íntegra da entrevista.

Mercado Ético: Durante a Conferência Internacional Ethos 2009, Ricardo Henriques, assessor da Presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), disse que sustentabilidade não é uma questão ambiental, mas, sim, econômica. Você concorda?


Simon Zadek: Sim, claro. Os desafios ambientais que enfrentamos agora se devem à forma como a economia e o comportamento dos indivíduos estão organizados. Acredito que o problema não está lá fora, mas em nossas mentes, na forma como imaginamos nós mesmos e nos relacionamos uns com os outros.

ME: Outra afirmação polêmica foi a de John Elkington, fundador da SustainAbility. Para ele, os consumidores não têm poder nenhum para mudar a situação presente.

SZ: Eu acho que o pensamento de que podemos mudar o mundo consumindo é errado. Mas eu acredito que a única forma de mudar é unindo todas as ações dos indivíduos em um contexto de coletividade. Não existe outra forma. Não acredito que a tecnologia sozinha ou apenas os políticos possam fazer a diferença. Nem a AccountAbility por si só pode mudar alguma coisa. Se pudesse, eu não estaria trabalhando aqui.

ME: Então, como fazer essa mudança?

SZ:
Nós desenvolvemos novas tecnologias, porque enxergamos oportunidades no mercado. Então, uma forma é colocando dinheiro na mesa. Outro ponto é a necessidade. Não poderemos mais lidar com a energia suja do carvão, petróleo ou gás. Os indivíduos também devem exigir um comportamento diferente daqueles que estão no poder.

ME: Empresas ligadas à energia limpa não têm tanta força quanto a indústria automobilística e os bancos, por exemplo. Esses setores foram os que mais tiveram ajuda dos governos quando a crise global estourou. Você vê um caminho para aumentar a influência das empresas verdes entre os políticos?


SZ: O que acontece é completamente errado. No Congresso dos Estados Unidos há 2.400 lobistas pagos para defender um acordo climático global. Do outro lado, há outros 2.300 lobistas contra isso. O ponto é se estamos fazendo lobby para as políticas públicas certas ou não. Temos de chegar a um acordo para que o mundo aqueça, no máximo, 3°C em 10 anos. Caso contrário, nada mais fará sentido, porque não estaremos aqui para contar a história.

ME: Hoje em dia, há um sentimento de que a crise não é tão grave quanto se pensava. Não corremos o risco de dar um passo atrás no que diz respeito à sustentabilidade?

SZ:
Exatamente. Se o PIB começar a subir novamente, vamos ver o aumento do consumo, do preço do petróleo etc. Nesse ponto, não acredito que exista alguma economia no mundo realmente preparada para avançar. Acho que há diversas economias que não querem mudanças e apenas um ou dois líderes políticos que querem avançar. Mas existe um número crescente de líderes políticos que entendem as oportunidades que estão surgindo. Nossa economia é basicamente fundamentada em altas emissões de carbono. Na verdade, sem as mudanças nos líderes, não vamos a lugar nenhum no entendimento dessa questão. Um exemplo: 75% da energia que o mundo consumirá em 2030 ainda não existem hoje. Então, nesse período, trilhões de dólares serão investidos em novas fontes de geração. Se não forçarmos uma agenda verde, teremos mais estações de energia a carvão e petróleo. Temos a oportunidade de tornar verdes 75% da geração de energia do mundo. Se não iniciarmos ações hoje, em cinco anos essa quantia cairá para 55%, porque outras 200 usinas de energia com alta emissão de carbono serão construídas. Então, temos uma incrível oportunidade diante de nós. Mas será que somos capazes de fazer isso? Tecnologicamente falando, sim, nós somos.

ME: Você acredita que o mercado de carbono pode contribuir para isso?

SZ: Preço alto para o carbono é uma parte essencial para alcançar a solução. Mas, para começo de conversa, essa não é a única. Existem outras mudanças também necessárias. Em segundo lugar, temos de assumir que entre hoje e 2020 os preços do carbono não serão altos o suficiente para fazer a diferença de que precisamos. Isso significa que nos próximos dez anos não teremos condições de depender dos preços do carbono. A razão para isso é que o mercado de carbono leva tempo para amadurecer e está concentrado nos Estados Unidos. Então, essa prática estará meio solta nos primeiros anos, por causa dos compromissos políticos que o governo do presidente Barak Obama terá de fazer. Ou seja, precisamos, sim, do mercado de carbono, mas não podemos depender somente disso. Precisamos de outras técnicas para fazer a diferença.

ME: Agora se discute muito a precificação de elementos que, antes, não tinham valor monetário, como, por exemplo, a floresta. Como e quanto cobrar pelos serviços naturais?

SZ:
Sabemos que o custo do carbono capturado pela floresta varia de 5 a 20 dólares por tonelada. Esse é o preço. É possível argumentar que o valor econômico seja mais alto, porque se pode incluir o valor da área florestada. O Brasil vem tomando a liderança em preservar esses valores e, até mesmo, em superá-los. Uma das propostas é coletar 10 dólares por tonelada, como faz o Fundo da Amazônia. Isso dá ao Brasil o dinheiro necessário para fazer o trabalho que precisa ser feito. Talvez chegue a sobrar alguma coisa. Mas isso ainda é muito mais barato do que reduzir as emissões das geradoras a carvão da China, o que deve custar 40 dólares por tonelada.

ME: Os bancos foram apontados como os grandes vilões da crise econômica mundial. Qual será o papel dessas instituições em uma nova economia global?

SZ:
É preciso acabar com a mentalidade de lucro de curto prazo e criar uma estratégia de longo termo. É preciso uma maior transparência das instituições, principalmente em instrumentos financeiros inovadores. E também mais responsabilidade da comunidade financeira. Nesse sentido, acho que os bancos podem ter um papel fundamental na economia do amanhã. Mas sozinhos, como já disse, não farão diferença.

ME: E que papel você vê para o Brasil?

SZ: No curto prazo, o Brasil tem de encorajar um forte acordo climático. Se conseguirmos atingir um acordo razoável em Copenhague, o resto é irrelevante. No momento, o Brasil é muito resistente a um acordo. Mas é preciso definir qual é o papel da comunidade empresarial em mudar essa decisão política. Vemos esse grupo fazendo um forte lobby para alcançar um acordo em dezembro ou vemos um grupo de empresas e indústrias que estão lucrando com baixos preços na emissão do carbono, desflorestamento e, portanto, pressionando o governo para não chegar a um acordo? Eu gostaria que a comunidade empresarial brasileira tomasse o primeiro caminho. Sem isso, tudo é irrelevante.

ME: Mas qual é o motivo de lutar por um mundo melhor? O planeta não estaria em melhores condições sem os humanos?


SZ:
Acho que o mundo vai ficar bem, não importa o que aconteça. Mas eu sou humano e tenho uma filha de 4 anos. Em primeiro lugar, quero que ela viva. Além disso, quero que ela tenha a segurança de uma vida decente. No momento, nós não estamos dando a ela essa chance.

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